segunda-feira

Incondicionalmente

Eu te amei demais
Amei cada defeito teu mais que cada virtude
Amei cada lágrima calada
Amei teus gestos perdidos
E teus sorrisos negados
Amei cada canto do teu corpo
Os conhecidos e ainda mais os escondidos
Te amei a cada mentira
Amei cada engano como se fosse verdade
Amei cada erro com mais vontade que os acertos
Amei tuas falhas
Amei sentindo a dor do teu silêncio
Amei calada aoa teu lado
E para compartilhar tuas dores, amei ainda mais
Amei para te fazer feliz
Amei para te deixar ser feliz
Amei para te deixar partir msmo partindo-me em mtas
Amei a cada espera mais do que cada chegada
Amei mais no dia de chuva que nos de sol
E por amor ainda sofro
Por te amar assim
Incondicionalmente

domingo

Ela ouvia vozes

Fernanda ouvia vozes.
Desde pequena ouvia
Abria a janela a noite,só para ouvir.
As vozes do mundo,dizia ela.

Fernanda era feliz.
Mas não era alegre.
Estava sempre sorrindo.
Um sorriso triste.

Era melancólica por natureza.
Tinha uma beleza nostálgica.
E uma vida monótona.

Era monocromática.
Não gostava de cor.
Mas tinha olhos azuis.

Era confusa.
Sabia o que queria.
E o que não queria.

Amava a todos.
Mas não amava ninguém.
Um paradoxo ambulante.

Fernanda era metade.
Sempre metade do que sonhara.

Amava mulheres.
Mas tinha um namorado.

Fernanda ouvia vozes.
Mas ninguém ouvia Fernanda.

sexta-feira

A menina que nada temia

Clara não temia a morte
Não temia a vida
Não temia a deus

Não temia seus pais.
Afinal,já era adulta.
Mas nunca temeu.
Nem mesmo quando seu pai gritou-lhe
Nem mesmo quando sua mãe bateu-lhe.
Não temeu o cão com raiva.
Nem os irmãos
Nem os colegas.

Clara não temia pessoas.
Nem seus fantasmas.

Chegou a adolescência
E Clara não temeu a nova escola.
Não temeu as festas.
Nem o álcool.
Nem as drogas.

Enfim,
tinha dezessete anos.
Fumava,bebia e se drogava.
Não temia nada.
Nem a ninguém

Terminou a escola.
Foi para a faculdade.
Não temeu nada.
Nem a republica.
Nem os professores.
Nem a morte quando a encarou de frente.

Clara conhecia tudo.
E nada temia.
Mas ela não conhecia o amor.
Mesmo assim não temia-o.
Porque não temia o desconhecido.


Clara achou que devia temer aquilo que nunca temera.
E fazer aquilo que nunca fizera.
Resolveu amar.
E temer o amor.
Mas não funcionou.
Porque amou a sim mesmo.
Amava e não temia.
Porque não conseguia temer o que não desejava

Clara tinha muitas certezas.
E viveu bem com todas elas.
Até conhecer o amor.
Clara se deu.
Se entregou.
Se libertou.

Clara não temia nada.
Por isso não sofria.
Não temia sofrer.
Porque até então não conhecia.

O ser amado temia Clara.
Temia seu não temer.
Temia-lhe tanto que a deixou.
A deixou conhecer aquilo que não temia.
Sem medo.
Afinal,ela dizia não temer o desconhecido.

Clara não entendia o porquê de ser deixada.
Não entendia o sofrimento.
Não entendia o porquê de não ter imaginado.
De não ter previsto.
Enfim, de não ter temido.

Acender a luz

Ela chegou bem devagar
Subiu de mansinho,a escada.
Mal se ouvia sua respiração.
Entrou em casa.
Não acendeu a luz.
Tirou os sapatos.
Colocou-os de lado,no canto perto da porta.
Deu dois passos à esquerda pois sabia que a frente tinha um vaso.
Avançou, ritmadamente.
Seguiu em silêncio,
Foi ate o quarto.
Tirou o vestido.
Voltou à sala.
Abriu a janela.
Ela adorava sentir a brisa em seu corpo.
Foi até a cozinha,já nua.
Uma taça.
Tateava a procura de uma taça no escuro.
Não desejava claridade.
Apenas vinho.
Um pouco de vinho
E estaria feliz.
Precisava de pouco para sê-lo.
Pegou um cigarro,na mesa de centro.
Lembrou-se, então, que havia parado de fumar.
Não acendeu-o.
Apenas levou-o a boca.
Fez que tragava.
Foi-se o vicio,não o hábito.
Deitou-se perto da janela.
Nua,olhando a lua.
Na mão esquerda a taça.
Noutra o cigarro apagado.
Ouvia uma musica.
Ao longe.
Um jazz, ou blues. Não tinha certeza..
Desconhecia sua origem.
Mas ouvia.
Sempre.
Desde sempre.
Fechou os olhos.
Sentindo um vento mais forte,arrepiou-se.
Sentia fome.
Mas o sono era mais forte.
Adormeceu assim.
Nua,debaixo da janela.
Ainda havia vinho na taça.
Mas a garrafa estava vazia.


Acordou,
Ainda era madrugada.
Havia derramado o vinho.
Taça caída no chão,junto ao corpo.
Sentiu saudades,
Nostálgica olhou em volta.
Ainda estava tudo escuro.
Tudo estava escuro e frio.
Lembrou-se que não ligou a calefação.
Havia se esquecido de como fazia frio a noite.
Mas tentou esquecer que não esperava ninguém.
Fazia muito tempo que ela havia partido.
Saíra numa manhã e nunca mais voltara.
Lembrou-se então das palavras da outra.
Sentia a lágrima descendo aos olhos e caindo em seu colo.
Procurava uma manta,encontrou seu penhoar.
Ah sim,lembrou-se das palavras exatas:
“-Não se preocupe. Volto de madrugada.”
Não voltou.
Não que ela tivesse mentido.
Não pensava assim.
Ela apenas não havia dito em que madrugada voltaria.
Por isso todos os dias, ela não acende as luzes.
E espera pela outra de madrugada.
Já passaram-se muitos madrugadas.
Já perdera a conta.

Amanhece,
O sol nasce lentamente.
Iluminando seu apartamento vazio.
Vê-se no espelho.
Repara que seu corpo já não é o mesmo de outrora.
Em seu rosto encontra marcas que nunca havia visto.
Faz um café,toma seu banho.
Faz a comida preferida dela,como todos os dias.
Repara que a cama continua intocada.
Nunca mais deitara-se lá.
Descobre que o vinho acabou.
Entra em pânico e pensa:
E se ela chegar e não tiver vinho?
Percebe que a dispensa esta vazia.
Precisa fazer compras.
Olha o calendário.
Tenta lembrar-se quanto tempo faz.
Procura a agenda.
Sabe que o aniversário dela está chegando.
Mas não sabe ao certo o dia.
Sabe que anotou. Sempre anota.
Queria fazer uma festa.
Surpresa,como todos os anos.
Mas ela nunca aparece.
A surpresa seria se ela viesse.
De madrugada.
Como prometera.

Enfim,
Ela espera.
Como todos os outros dia.
Chega em casa e não acende as luzes.
Como sempre.
Já acostumou-se a escuridão.
Esta no escuro desde que a outra a deixara.

Abre a janela,mas essa noite não se vê a lua.
E nem há brisa.
Sabe que a ama.
E por isso espera.
Como sempre.
Hoje não ouve a musica.
Pela primeira vez não ouve.
Não entende.
O silêncio a incomoda.
Resolve gritar.
Gritar que a ama.
Enche os pulmões de ar.
O que não é fácil para uma ex-fumante.
E com toda sua força.
Com todo seu amor.
Como toda a certeza que reina na sua escuridão...
Grita:
-Eu te amo.
Percebe que a outra não pode ouvi-la.
E resolve gritar para o mundo que a ama.
Novamente grita.
Grita: - Eu amo a....
-Amo a....
Para. Assustada.
Percebe que não lembra o nome dela.
Pensa,pensa,pensa.
Não lembra.
Vai até a porta.
Acende a luz.
São três da manhã.
E ela acendeu a luz.
Acendeu a luz.

quinta-feira

Primeira vez

A primeira vez a gente nunca esquece.Bem verdade que é o que dizem...
Apenas sei que p primeiro post passa sempre despercebido.
Para que este não seja esquecido,não usarei minha palavras, o que não é meu objetivo nesse blog,exceto por pequenos trechos que valem sempre serem lembrados.
Então ja começo com uma exceção:


“Estremeço de prazer por entre a novidade de usar palavras que formam intenso matagal! Luto por conquistar mais profundamente a minha liberdade de sensações e pensamentos, sem nenhum sentido utilitário: sou sozinha, eu e minha liberdade. É tamanha a liberdade que pode escandalizar um primitivo mas sei que não te escandalizas com a plenitude que consigo e que é sem fronteiras perceptíveis. Esta minha capacidade de viver o que é redondo e amplo - cerco-me por plantas carnívoras e animais legendários, tudo banhado pela tosca e esquerda luz de um sexo mítico. Vou adiante de modo intuitivo e sem procurar uma idéia: sou orgânica. E não me indago sobre os meus motivos. Mergulho na quase dor de uma intensa alegria... Não sei sobre o que estou escrevendo: sou obscura para mim mesma. Só tive inicialmente uma visão lunar e lúcida, e então prendi para mim o instante antes que ele morresse e que perpetuamente morre. Não é um recado de idéias que te transmito e sim uma instintiva volúpia daquilo que está escondido na natureza e que adivinho. E esta é uma festa de palavras. Escrevo em signos que são mais um gesto que voz. Tudo isso é o que me habituei a pintar mexendo na natureza íntima das coisas. Mas agora chegou a hora de parar a pintura para me refazer, refaço-me nestas linhas. Tenho uma voz. Assim como me lanço no traço de meu desenho, este é um exercício de vida sem planejamento. O mundo não tem ordem visível e eu só tenho a ordem da respiração. Deixo-me acontecer.Estou dentro dos grandes sonhos da noite: pois o agora-já é de noite.. ..Minha aura é mistério de vida. Eu me ultrapasso abdicando de mim e então sou o mundo: sigo a voz do mundo, eu mesma de súbito com voz única.O mundo: um emaranhado de fios teleféricos em eriçamento. E a luminosidade no entanto obscura: esta sou eu diante do mundo....Equilíbrio perigoso, o meu, o perigo de morte de alma. Minha selvagem intuição de mim mesma. Mas o meu principal está sempre escondido. Sou implícita. E quando vou me explicar perco a úmida intimidade.De que cor é o infinito espacial? é da cor do ar. Nós - diante do escândalo da morte.Ouve apenas superficialmente o que digo e da falta de sentido nascerá um sentido como de mim nasce inexplicavelmente vida alta e leve. A densa selva de palavras envolve espessamente o que sinto e vivo, e transforma tudo o que sou em alguma coisa minha que fica fora de mim. A natureza é envolvente: ela me enovela toda e é sexualmente viva, apenas isto: viva.”C. Lispector